quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Come to Daddy (2019)

 

 

★★★★

Diretor: Ant Timpson
Roteirista: Toby Harvard (história e roteiro), Ant Timpson (idéia)
Elenco: Elijah Wood, Stephen McHattie, Garfield Wilson, Madeleine Sami, Martin Donovan, Michael Smiley, Simon Chin, Ona Grauer, Ryan Beil, Raresh DiMofte, Alla Rouba, Noam Zylberman, Gord Middleton, Oliver Wilson (...).
Gênero: Terror / Comédia
Ano: 2019
País: Canadá / Irlanda / Nova Zelândia

Elijah Wood tem demonstrado ano após ano que não é apenas o Frodo, da trilogia “Senhor dos Anéis”. O ator tem tomado decisões acertadas de atuar em filmes independentes de baixo orçamento interessantíssimos cuja maior prioridade é a criatividade das histórias aliada a uma direção competente, sem as pompas dos grandes estúdios e dos orçamentos estratosféricos. Após o divertidíssimo “Já Não Me Sinto em Casa Nesse Mundo” (2017), do também excelente e estreante Macon Blair, vem agora o ótimo e pirado “Come to Daddy” (2019), que vai colocar um sorriso no rosto dos fãs de uma boa comédia de terror.

Norval Greenwood (Elijah Wood) recebe uma carta de seu pai (interpretado por um louco Stephen McHattie), com quem não fala desde que desapareceu de sua vida enquanto ainda criança, convidando-o a visitá-lo em sua casa isolada na floresta. Curioso por muitos motivos, e também um pouco nervoso, Norval aceita o convite esperando obter algumas respostas, o que ele não espera, porém, ao chegar lá, é ser recebido com insultos e comportamentos agressivos à sua personalidade tímida e também um tanto quanto esnobe. E aqui termina essa curta sinopse, pois informação demais podem estragar algumas surpresas e reviravoltas de um dos filmes mais malucos e insanamente divertidos do ano.

Em suma, Norval é um jovem que cresceu em Beverly Hills sozinho com sua mãe. De caráter inocente, tímido e esnobe por conta de sua convivência com pessoas famosas e ricas, Norval apresenta uma personalidade frágil tanto física quanto emocionalmente, e muito disso se deve, também, a falta de uma figura paterna em sua infância e adolescência. A falta dessa figura paterna, aliás, mostra-se como uma das boas sacadas do filme, porque quando a maluquice e insanidade acontecem, não há maneiras de prever adequadamente as reações desse personagem, que com os olhos demonstra muito toda a sua inocência e fragilidade frente a situações inimagináveis. Vê-lo lidar com tais situações abusivas e violentas é hilário principalmente pelo fato de tudo aquilo ser completamente novo para ele, que nunca sofreu ou presenciou qualquer tipo de violência durante toda a sua vida. Norval, portanto, até certo ponto é a personificação do espectador (ou pelo menos da grande maioria deles) que, assim como ele, também nunca presenciou qualquer tipo de violência em sua vida, e por causa disso, conjuntamente ao personagem, vai ser levado a pensar em alternativas para conseguir sair dessas situações.  Essa maneira de trazer o público para perto do personagem funciona e é um dos trunfos do diretor.

Falando nisso, o filme não deixa o ritmo cair por causa de uma boa quantidade de reviravoltas adequadamente inseridas em momentos estratégicos. Essas reviravoltas levam o filme a seguir caminhos contrários aos caminhos traçados a princípio, mudando completamente a direção criando situações com as quais Norval vai precisar aprender a lidar rapidamente para sobreviver, dando novos ares à trama que, juntamente com a sua curta duração, não deixa o fôlego acabar. E dentro disso o que chama atenção é o gore muito bem feito. Quando há mortes, elas são incomodamente divertidas tanto pelas situações inusitadas (e acredite, há várias!), quanto pela gravidade dos ferimentos sofridos pelos personagens, ferimentos que são todos mostrados on screen sem dó nem piedade. Algumas dessas mortes chegam a arrepiar de tão gráficas, especial e especificamente uma que ocorre no final, após uma cena divertidíssima num motel.

Todo esse sangue ganha ainda mais sentido quando o nome por trás da obra aparece: Ant Timpson. Esse neozelandês maluco assume aqui seu primeiro filme como diretor, mas trazendo influências de filmes como “Housebound” (2014), “Deathgasm” (2015) e “Turbo Kid” (2015), que foram produzidos por ele e que também carregam uma grande quantidade de humor negro e gore. Ou seja, quando o assunto é humor negro extremamente ácido e sangue jorrando na tela, é com ele mesmo.

Extremamente divertido e recheado de humor e sangue, fãs de filmes de terror oitentistas que buscam nos filmes de hoje essa aura independente e bem feita do baixo orçamento combinado às boas doses de criatividade e gore, encontrarão aqui uma boa pedida. É uma grata surpresa com a qual, bastante curioso, já começo desde já a esperar pelos seus próximos projetos.    



sexta-feira, 17 de julho de 2020

Hellraiser: Inferno na Terra (Hellraiser: Hell on Earth, 1992)


★★★

Diretor: Anthony Hickox
Roteirista: Peter Atkins; Clive Barker (história)
Elenco: Doug Bradley, Kevin Bernhardt, Lawrence Mortorff, Terry Farrell, Ken Carpenter, Sharon Hill, Paula Marshall, Robert C. Treveiler, Philip Hyland, David Young, Brent Bolthouse, Peter Atkins (…)
Gênero: Terror
Ano: 1992
País: Estados Unidos/Reino Unido

I am the way!

“Hellraiser III: Inferno na Terra” (1992) foi um dos inúmeros filmes de terror que marcaram minha infância. Lembro ainda hoje de ir à locadora com meu pai e me deparar com a capa do famigerado “demônio com o rosto cheio de pregos”. Era Pinhead, o líder dos cenobitas, que tão logo veio a se tornar um dos meus personagens preferidos do cinema de terror. Na estante estavam os três primeiros filmes, e o fato de os dois primeiros não estarem disponíveis me obrigou a começar a franquia a partir desta terceira parte. Eu era um moleque, na segunda metade dos anos noventa, obcecado por qualquer história de terror que pudesse encontrar. Se fosse das mais sangrentas e bizarras, melhor. E por isso, à época, este filme me foi um deleite: encontrei boas mortes, um pouco de blasfêmia (sim, fui uma criança muito diferente) e uma final girl linda (que de tudo o que esperava dela, infelizmente só não me entregou os peitinhos, que fiquei durante toda a duração do filme esperando para ver). Era tudo o que uma criança louca pelo gênero poderia querer.

Então comecei a franquia a partir dessa terceira parte, mas foi questão de pouco tempo até finalmente conhecer o primeiro filme e posteriormente o segundo. O primeiro, escrito e dirigido pelo brilhante Clive Barker, é uma obra de arte que traz sofrimento, melancolia, história de um relacionamento abusivo, distúrbios de caráter, sadomasoquismo etc. em sua mais de uma hora e meia de duração. O filme causa repulsa, nojo, carisma por determinados personagens, alguns sentimentos conflitantes a respeito de outros, tudo embasado numa história muito bem desenvolvida, como já era de se esperar de um escritor fora da curva. Esse mais do que excelente primeiro filme, então, definiu um padrão tão alto que ficaria difícil quaisquer obras que viessem a seguir igualá-lo ou superá-lo. O segundo, por exemplo, apesar de muito bom, não se aproxima do que o primeiro construiu, embora haja momentos que assemelhem. O terceiro... Bem, se o segundo não chega muito perto, o terceiro está mais para uma bola que erra o gol e sai para fora do estágio: está muito, muito longe. E embora eu saiba disso, isso não me impede de me divertir, com um sorriso no rosto, ainda nos dias de hoje quando o assisto. O filme tem seus erros, mas também tem, sim, seus méritos.

Aqui, a personagem principal é Joey (interpretada pela belíssima Terry Farrell), uma jornalista que ao presenciar um rapaz todo perfurado por correntes chegar ao hospital para em seguida ser violenta e misteriosamente morto, enxerga nisso uma oportunidade de investigação para tentar alavancar sua carreira decadente. Ela conhece então Terri (Paula Marshall), a garota que chegou ao hospital com o rapaz e que é responsável por dar à jornalista alguma ajuda que a acaba levando ao submundo dos prazeres violentos da carne liderado por Pinhead (interpretado pelo sempre excelente e icônico Doug Bradley). J. P. Monroe (Kevin Bernhardt), por sua vez, entra nesse triângulo como ex-namorado de Terri e responsável por liberar acidentalmente Pinhead de sua prisão.

Como já era de se esperar, o diretor Anthony Hickox conduz a história de forma completamente oposta à atmosfera criada por Barker no seu filme de estreia. Na verdade, ele segue um pouco um gancho narrativo levemente aberto pela segunda continuação. No segundo, ao contrário do primeiro, as coisas acontecem um pouco explicita e freneticamente, por assim dizer (com direito a cenas cujos personagens acabam sendo levados a uma viagem ao “inferno”), com alguns possíveis excessos responsáveis por desagradar a uma parcela (pequena, a título de registro) dos fãs da franquia, mas que ainda assim não compromete o resultado final. O foco, portanto, passa a ser mais voltado aos demônios, mostrando muito mais sobre eles e o submundo no qual vivem. Neste terceiro todo o exagero foi elevado ao quadrado. A opção foi a de criar um filme menos sério (há um diálogo entre Joey e um padre que é hilário), menos atmosférico e com menos suspense, mas mais voltado a cenas gore, personagens exagerados e diálogos com frases de efeito, e com um enfoque em Pinhead, que aparece solitário por quase todo o filme, sendo os cenobitas apresentados somente no terceiro ato. Sobre os diálogos, aliás, o que não falta aqui são frases de efeito (todas elas muito legais, diga-se de passagem). Portanto os excessos foram concebidos junto com o filme, que foi criado para ser justamente dessa forma, ou seja, sem muitas pretensões. E é nisso que reside alguns de seus erros e acertos.

As atuações são exageradas e todas beiram a canastrice pura, o que acaba criando momentos cartunescos conflitantes com momentos sérios, o que demonstra clara indecisão do diretor na condução dos atores. Apesar disso, dá para dizer com certeza que atuações ruins em filmes confessadamente exagerados não são o pior dos problemas. Dentro desse universo do terceiro filme, se visto como uma história individual, dá para relevar sem muito esforço, o problema é que ele faz parte de um universo com regras já preestabelecidas, regras essas que esse terceiro filme (e vários outros da franquia) não segue. E isso pode ser estendido a praticamente todos os defeitos que essa terceira parte possa ter. Por outro lado, o fato de o filme já ter sido concebido para ser dessa forma ajuda a diminuir um pouco o impacto negativo. Tendo isso em mente, aqueles que procuram por um bom filme de terror vão encontrar aqui uma boa fonte de diversão, pois o filme é um banho de sangue com direito a um massacre lindo num clube e também a melhor cena de toda a trama e uma das melhores de toda a franquia, quando Pinhead entra numa igreja católica à procura de Joey. Essa cena se destaca pela ousadia, pois mostra o líder dos cenobitas simulando sua própria crucificação enquanto pronuncia, no final, os dizeres da citação no início deste texto. Além disso também simula uma comunhão retirando um pedaço de sua própria carne para colocar na boca do padre: “Este é meu corpo, este é meu sangue. Felizes os que vêm a minha ceia”. Essa cena causou controvérsia na sociedade conservadora da Carolina do Norte. O diretor foi proibido de filmar numa igreja, por isso teve de criar todo o cenário num set de filmagem. Alguns do próprio elenco chegaram a reclamar da cena também, o que Hickcox conseguiu contornar ao explicar que o que ele estava fazendo não era tão diferente do que outros diretores fizeram nos incontáveis filmes sobre Drácula, da Hammer, com Christopher Lee, por exemplo. 

Com a morte de alguns cenobitas no filme anterior, Pinhead, para conseguir perseguir a protagonista e finalizar seu plano, precisou criar novos servos que dentro de suas limitações são até interessantes: tem o cenobita com a cabeça cravejada de CDs cujos quais ele usa para matar; tem o cinegrafista e amigo da protagonista que em certo ponto também se transforma numa dessas entidades, sendo ele um cenobita com uma câmera no lugar de um dos olhos; e um com alguns aparatos mecânicos atravessados na cabeça; há também uma garota com uma abertura na traqueia com um cigarro (!!!) preso a ela; e por fim outra garota com arame farpado enrolado na cabeça. Todos possuem pouco tempo em cena, o que foi pensado para poder dar mais desenvolvimento e tempo de cena ao vilão principal e líder deles.

Uma coisa que merece ser mencionada é a música tema homônima composta por Lemmy e Ozzy, que, magistralmente executada pelos lendários Motörhead com a inconfundível voz de Lemmy, fizeram-na já nascer clássica, combinando tanto com o clima do filme, e vice-versa, que chega a ser difícil separar um do outro, criando um desses raros momentos de simbiose que merecem ser apreciados. E falando em boa música, foi um dos meus primeiros contatos com o Rock ‘n’ Roll e Heavy Metal. Dali em diante eu já sabia qual rumo, musicalmente falando, eu gostaria de seguir. A trilha, inclusive, também conta com Armored Saint que, além de presentear o filme com algumas boas canções nas cenas que envolvem a boate, também aparecem representando a si mesmos nos shows desse clube. São, portanto, dois méritos que todo o fã de terror que se preze vai provavelmente elogiar: o gore de qualidade e a trilha recheada com o bom e velho Heavy Metal.

Uma curiosidade digna de nota é que a direção do filme foi oferecida a Peter Jackson, que acabou recusando a proposta por pensar que não poderia dirigir um filme de terror sério (por mais irônico que possa parecer). O neozelandês é bastante conhecido entre os fãs de terror por dirigir alguns clássicos do cinema podreira, “Náusea Total (Bad Taste, 1987)” e “Fome Animal (Braindead, 1992)”, que, além dos altos níveis de sangue e nojeira, também carregam uma carga grande de comédia, principalmente de um excelente e extremo humor negro. Ele acabou gostando do produto final, mas disse que faria modificações principalmente com relação a Pinhead. Disse, por exemplo, que gostaria de vê-lo sendo golpeado no rosto, contra uma parede, para que seus pinos fossem todos enterrados na carne e ossos, dizendo que esse tipo de humor faz parte de seu jeito de ser e de fazer cinema de horror. E de fato faz. Jackson voltaria a lançar outro filme de terror quatro anos depois, seu hilariante e ao mesmo tempo tenso “Os Espíritos (The Frighteners, 1996)”.

Então, como saldo final, “Hellraiser III: Inferno na Terra” se mostra uma continuação decente. Tem quase tudo daquilo que se procura num bom filme do gênero, boas mortes, um pouco de blasfêmia, de brinde um pouco de Metal e, como continuação, a ampliação do universo sombrio e sadomasoquista dos cenobitas e seu líder. Por outro lado, erra nas caracterizações cartunescas dos personagens, em alguns exageros e na construção dos novos e quase descartáveis cenobitas, que praticamente não possuem tempo suficiente em cena. O saldo é positivo. Chegou a marcar algumas pessoas de uma geração tanto pelo conteúdo violento quanto pela boa música. De fato não é dos maiores da franquia, mas ainda assim é uma boa e divertida continuação. 



sábado, 11 de julho de 2020

The Shed (2019)



Diretor: Frank Sabatella
Roteirista: Frank Sabatella
Elenco: Jay Jay Warren, Cody Kostro, Sofia Happonen, Frank Whaley, Timothy Bottoms, Siobhan Fallon Hogan, Chris Petrovski, Francisco Burgos, Uly Schlesinger, Mu-Shaka Benson, Drew Moore, Caroline Duncan, Sal Rendino (...).
Gênero: Terror
Ano: 2019
País: Estados Unidos

Após uma sessão extremamente divertida com “Haunt” (2019) na noite anterior, pensei em pesquisar por outros filmes de baixo orçamento que pudessem ser tão divertidos quanto. Filmes descerebrados cujo valor de entretenimento pudessem fazer valer uma hora e meia ou uma hora e quarenta de diversão. Eis que na busca por algo assim me deparo com o que a princípio me pareceu interessante: “The Shed” (2019), segundo filme de Frank Sabatella (o primeiro é o “Blood Night: The Legend of Mary Hatchet”, de 2009) que traz como premissa um vampiro preso num pequeno galpão no quintal da casa onde vivem Stan (Jay Jay Warren) e seu avô abusivo e violento Ellis (Timothy Bottoms).

Stan é um jovem problemático que durante alguns anos de sua vida viveu em instituições comandadas pelo estado. Aparentemente, sem conseguir lidar com a perda precoce de seus pais, o garoto acabou optando por trilhar um caminho longe das amarras da lei, que por consequência o acabou colocando nesses lugares. Lidar com um avô extremamente violento, e posteriormente com o vampiro preso no galpão, é sua única alternativa para não mais voltar a lidar com as autoridades dessas instituições.  A única boa companhia que tem em sua vida miserável é a de seu melhor amigo Dommer (Cody Kostro), um nerd solitário cujo qual Stan gasta boa parte de seu tempo defendendo dos valentões. Já Roxy (Sofia Happonen) é a garota por quem é apaixonado, mas que namora justamente o líder dos valentões.

Sabatella tenta conferir profundidade à história através de metáforas sobre o bullying, mas acaba fracassando, pois nada do que se vê em tela tem seu devido desenvolvimento. O que se sabe sobre qualquer um dos personagens é muito pouco ou quase nada. Sabe-se, por exemplo, que Stan e Roxy eram amigos próximos no passado e que tal amizade se desfez na adolescência, mas nada além disso tem continuidade no desenrolar da trama. Dommer, por sua vez, é um completo enigma. Não há informação alguma sobre ele, sobre seu passado, sobre sua família etc., a não ser aquela que se vê acontecendo em cena, que são os problemas com os valentões apenas. Sua relação com o vampiro, aliás, tem papel fundamental nesse paralelo traçado pelo diretor quanto às pessoas que sofrem nas mãos de outros alunos na escola, mas não causa impacto pois, além da falta de sutilezas, não há progresso sobre o assunto ao longo da história. O vampiro é visto por Dommer como uma porta de saída de uma vida estudantil miserável e sofrida. Ele enlouquece aos poucos ao ponto de querer dar um fim aos seus algozes utilizando o ser sugador de sangue.  Stan, enquanto tenta resolver o problema de ter um vampiro no galpão de sua casa, tenta mediar a situação de modo a não deixar que seu melhor amigo perca a cabeça.

O que podia ter sido um filme interessante e divertido sobre o tema acaba então desperdiçado por um roteiro que parece ter sido remendado com situações e propostas que não se sustentam. Cenas que se alongam demais não deixam as coisas acontecerem naturalmente e o que acontece é pobremente desenvolvido, fazendo com que a curta duração de 98 minutos pareça uma eternidade. As ações dos personagens são questionáveis – o terceiro ato que o diga – e o fato de serem completos estranhos para o público não os ajudam a se tornar interessantes. Aliás, o que eles são é o oposto disso. Com relação ao vampiro, sua força sobre-humana fica clara desde o início ao destroçar um dos personagens que ousa adentrar o galpão e também ao destruir com facilidade parte da porta do mesmo. O que não fica claro, por exemplo, são os motivos pelos quais ele não destrói tudo durante a noite e foge, por exemplo. E advinha? O roteiro não tem uma resposta para isso também, assim como não tem para metade das coisas que acontecem.

Então algumas pessoas podem se perguntar: é preciso tanto requisito assim para que um filme de baixo orçamento renda alguma diversão? Simples, desenvolvimento aprofundado em filme de terror decerebrado pode não ser um dos principais requisitos - e de fato não o é - quando o gore (principalmente, mas não necessariamente, quando vem aliado a boas doses de nudez e sacanagem), por exemplo, é excelente, mas infelizmente também não é o que acontece aqui. Está mais para um filme adolescente sem sal com pretensões de passar uma mensagem importante que acaba presa dentro de suas inúmeras limitações. Para que uma boa mensagem seja passada, é necessário que ela se valha de um bom desenvolvimento de suas premissas, caso contrário se torna inócua e irrelevante. Não funciona. Não chega nem perto de funcionar.

No final, a sensação é a de tempo perdido. Tinha potencial para ser um divertido filme de vampiro com questões importantes que rondam o mundo adolescente, mas acaba desperdiçado em meio a diálogos expositivos de um roteiro preguiçoso que insiste em cenas desnecessárias, dentre as quais, por exemplo, as de sonhos dentro de sonhos que simplesmente não funcionam e só causam vergonha alheia por tamanha ineficiência, subestimando inclusive a inteligência do espectador ao tentar incitar um susto que nunca vem. Acho que tudo isso explica os motivos pelos quais Sabatella demorou dez anos para conseguir filmar este seu segundo filme. Ainda não foi dessa vez, infelizmente.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Haunt (2019)


★★

Diretor: Scott Beck, Bryan Woods
Roteirista: Scott Beck, Bryan Woods
Elenco: Katie Stevens, Will Brittain, Lauryn Alisa McClain, Andrew Caldwell, Shazi Raja, Schuyler Helford, Phillip Johnson Richardson, Chaney Morrow, Justin Marxen, Terri Partyka, Justin Rose, Damian Maffei, Schuyler White, Samuel Hunt (...).
Gênero: Terror
Ano: 2019
País: Estados Unidos

Escrito e dirigido por Scott Beck e Bryan Woods, “Haunt” (2019) é a nova empreitada da dupla de roteiristas do excelente “Um Lugar Silencioso” (2018), que agora volta à direção, após quatro anos (onde estrearam com o não tão bem recebido “Nightlight”), para entregar um slasher bastante sangrento e divertido ambientado numa noite de Halloween.

Trata-se de alguns amigos que, após uma festa a fantasia, saem à procura de diversão extra, encontrando-a numa casa mal assombrada numa estrada no meio do nada. Eles são recebidos por uma pessoa vestindo uma fantasia e máscara de palhaço que impõe algumas regras antes de deixá-los entrar: é necessário preencher um formulário com algumas informações pessoais; e o mais importante, ninguém pode levar seu celular para dentro da casa. Ao adentrar, eles se deparam com cenários que emulam os famosos “escape rooms”, onde eles têm de procurar alternativas para conseguirem passar de nível até chegar à saída. No meio disso, armadilhas capturam algumas pessoas que são usadas no teatro macabro proporcionado pelos mascarados da casa.

Um dos méritos da dupla Beck/Woods é saber conduzir o suspense através dos diversos níveis desse misterioso lugar, e os vilões mascarados, muito bem trabalhados pela dupla, tem papel fundamental nisso. Os cenários aterrorizantes e claustrofóbicos pelos quais o grupo de amigos precisa passar corroboram bastante na criação da tensão. Há maneiras de conseguir achar a saída de certo nível para passar para o seguinte, mas são maneiras incômodas e muitas vezes perigosas que vão desde desafios aparentemente inofensivos até outros evidentemente perigosos. Com os mascarados da casa, aliás, não é diferente, eles conferem um ar ainda mais macabro e misterioso a um ambiente que por si só já é assustador, e a tensão e desconforto só aumentam conforme eles vão progressivamente aparecendo. Eles são violentos quando precisam ser e também muito misteriosos tanto sob a perspectiva do espectador quanto do grupo, que estão no mesmo barco e não fazem ideia de quem são essas pessoas. Um dos pontos altos, aliás, é quando o primeiro deles se revela, mostrando-se completamente diferente do imaginado, dando novo fôlego à história que segue cada vez mais violenta.

Quando as atrocidades acontecem, os fãs de gore não vão se decepcionar. O sangue escorre como deve em filmes do gênero. Não são cenas extremamente gráficas, mas são muito satisfatórias dentro da proposta empregada aqui, e vai desde uma cabeça sendo perfurada até outra sendo estourada. O suspense então vai crescendo principalmente quando um dos fantasiados resolve ajudar o grupo, dizendo que não sabia que tudo aquilo tomaria o rumo violento que tomou – e vocês, espectadores, como os personagens, encontram-se sem saber exatamente o que pensar, pois ainda não há como ter certeza sobre se o que ele diz é realmente verdade; esse artifício na construção da tensão se mostra bastante eficiente, pois, diante de toda a atrocidade, a única coisa que passa pela cabeça é querer vê-los todos saindo bem daquele lugar, então fica difícil tomar uma decisão seja confiando ou não nessa pessoa, e esse impasse ajuda muito na progressão da tensão. O maior problema, no entanto, são os flashbacks e a trama paralela da personagem principal Harper (interpretada por Katie Stevens, que aparece noutro filme do mesmo ano, “Polaroid”, num papel de pouca relevância), que seguram o desenvolvimento da história e falham na tentativa de humanizar a personagem, uma vez que nada disso é minimamente desenvolvido.

Quando as coisas saem completamente do controle no terceiro ato, o filme também perde um pouco de sua força. Algumas transições entre tomadas externas e internas não parecem naturais ao mostrar alguém saindo e entrando na casa, passando uma noção confusa de senso de espaço, e o suspense que antes existia e que era um dos pontos fortes deixa de existir. A tensão também diminui gradativamente conforme atitudes duvidosas são tomadas por parte dos personagens. Agora, a inconsistência do final propriamente dito é a banho de sangue frio, visto que não corresponde ao que foi criado e nem à cronologia da trama. Como que determinada personagem conseguiu fazer o que fez após ser hospitalizada dentro do curto espaço de tempo até um dos vilões chegar à sua casa? São ações que não se encaixam.

“Haunt”, portanto, é um slasher divertido com boas doses de criatividade – com parte dela envolvendo os vilões –, sangue, suspense e tensão que funcionam até o início do terceiro ato e que superam os defeitos e inconsistências apresentadas nas tramas paralelas desnecessárias e o final morno que não faz jus ao que foi desenvolvido. Os méritos são maiores do que os deméritos. Fãs do gênero terão aqui uma hora e meia, aproximadamente, de diversão certa.



Sessão Dupla: Os Goonies (1985) e Conta Comigo (1986)

      Os Goonies (The Goonies, 1985) – Richard Donner Conta Comigo (Stand by Me, 1986) – Rob Reiner Dentre as várias combinações possíveis...