sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Maratona de Halloween 2024: #10, O Encanador (The Plumber, 1979)

 

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Diretor: Peter Weir
Roteiro: Peter Weir, Harold Lander
Elenco: Judy Morris, Ivar Kants, Robert Coleby, Candy Raymond, Henri Szeps, Yomi Abiodun, Beverley Roberts, Bruce Rosen, Daphne Grey, Meme Thorne, David Burchell, Paul Sonkkila, Pam Sanders, Rick Hart, Giovanni Giglio
Gênero: Suspense / Dark Humor
Ano: 1979
País: Austrália
Duração: 77 min

Peter Weir, diretor de “Piquenique na Montanha Misteriosa” ("Picnic at Hanging Rock", 1975) e do mais conhecido do grande público “Sociedade dos Poetas Mortos” ("Dead Poets Society", 1989), já vinha de alguns sucessos anteriores quando resolveu entregar aqui, neste filme feito para tevê, uma história que é ao mesmo tempo extremamente desconfortável, divertida, com algumas pitadas de um humor que vieram para ajudar a realçar tais momentos desconfortáveis. Embora este seja um projeto feito para tevê, pode também, assim como os filmes já citados e tantos outros anteriores que ajudaram a render a Weir o status de um grande diretor, ser considerado mais um sucesso de sua filmografia.

“The Plumber” conta a história de Jill Cowper (Judy Morris) e Brian Cowper (Robert Coleby), um casal de acadêmicos que começa a ter problemas quando o encanador Max (Ivar Kants) chega ao apartamento deles para consertar o encanamento no banheiro. Logo de início Jill já começa a achar toda a situação muito estranha, porque nem ela e nem o marido pediram por nenhum encanador, visto que eles próprios não haviam notado problema algum. No entanto Max a convence de que precisa entrar para verificar, uma vez que o prédio é da Universidade – que é para quem ele trabalha –, que pediu a ele que verificasse os banheiros de todos os moradores. Algo como um procedimento padrão que ele precisaria cumprir. Assim, mesmo que desconfiada, Jill o deixa entrar. No entanto, não demora as coisas começam a ficar estranhas;  do banheiro é possível ouvir sons que mais parecem cantos e cantarolas ao som de água caindo do chuveiro, o que acaba passando a impressão de que o encanador pode estar aproveitando da situação para tomar banho.

A apresentação de Max, aliás, é bastante interessante; primeiro são mostrados ao espectador algumas características de sua vestimenta, como as luvas de couro negro, sua calça jeans desbotada e sua jaqueta. Isto é, um estilo mais livre de se vestir, por assim dizer. A trilha também corrobora mostrando que pode realmente haver algo de diferente no rapaz. Já o casal, Jill e Brian, tem sua primeira aparição em cena justamente no local onde seus grandes problemas começarão a lhes atormentar a vida: no banheiro. O casal, que recentemente voltou de Papua Nova Guiné, trabalha em áreas diferentes. Jill é antropóloga e trabalha em sua tese que vai lhe render um livro sobre seu estudo feito com os nativos do país em que esteve; já Brian é um nutricionista que almeja um posto na OMS. Embora de áreas diferentes, ambos estudam os nativos sob suas respectivas áreas de atuação. Com a chegada do encanador, porém, suas vidas, mas a de Jill principalmente, começa a virar de cabeça para baixo.

O jovem rapaz, de estilo despojado e cabelos desgrenhados, começa a demonstrar uma personalidade invasiva ao tentar desenvolver conversas íntimas que Jill tenta interromper e não levar adiante. Tentativa que acaba se mostrando em vão, visto que Max é um incansável falastrão. São conversas que ele inicia que falam sobre o fato de os ralos do prédio estarem entupidos de cabelos, ao fato de que o marido de Jill está ficando careca. Ele deduz esta última parte ao mexer nos pertences pessoais do casal e ver uma loção contra queda de cabelo.

Não bastasse todos os tipos de conversas invasivas e até mesmo íntimas em algum grau, Max praticamente “destrói” todo o banheiro do casal, o que de fato acaba mostrando que ele não está ali para consertar, mas para atormentar. O contraponto nisso tudo é que, por pior que possa ser a impressão que ele passe, ele tenta sempre ser prestativo de alguma forma, mas acaba não funcionando muito bem, pelo menos na visão de Jill, por causa dessas inconveniências todas. A dúvida que pode pairar é a seguinte: será que ele não é apenas uma pessoa comum e sem instrução, como ele mesmo diz em certo momento, tentando ser prestativo e ao mesmo tempo legal? Algumas pessoas simplesmente são invasivas e inconvenientes sem saber. Será que não é o caso dele? São dúvidas verdadeiras que rondam parte da obra e ajudam muito na construção de desconforto e de dúvida que o diretor constrói.

Com tudo isso, uma das cenas mais desconfortáveis é quando Jill prepara um jantar aos convidados de Brian, dentre os quais se encontram os membros da OMS que estão avaliando os estudos do ambicioso nutricionista. Com o banheiro todo destruído, não há como imaginar que algo bom sairia disso tudo. Então o que acontece a seguir são alguns dos momentos mais inusitados de todo o filme.

Interessante que a intenção de Weir é traçar um questionamento sobre o comportamento humano em diferentes níveis sociais e também sobre uma divisão social muito presente nas sociedades. E tudo isso é muito efetivo principalmente porque ele utiliza de diferentes artifícios para criar contrastes e para ressaltar tais elementos. Por exemplo, a antropóloga estuda o comportamento primitivo dos povos nativos da Papua Nova Guiné, e tanto ela quanto o marido são extremamente instruídos. A trilha é composta de sons tribais e a decoração da casa deles é composta por artefatos indígenas antigos. O encanador, por sua vez, possui seu estilo e sua maneira de ser que é oposta a deles, não tem instrução alguma e é fã de Rock 'n' Roll. Ou seja, há um contraste ali que indica que certos comportamentos não estão ligados apenas com o nível de instrução de cada um, mas também com o meio no qual se está inserido. Com a construção de tudo isso já sedimentada, o que acontece no final não é nada menos que um grande desfecho para um grande filme.

Peter Weir, que também roteirizou o longa, baseou esta história em dois casos reais. O primeiro caso envolve alguns de seus amigos, que passaram a receber inúmeras visitas de um encanador incompetente que de fato os atormentou durante certo período com tais visitas. Já o segundo envolve o próprio diretor, que baseou o rapaz em alguém que ele deu carona uma vez. De acordo com o diretor, que conta muitas curiosidades sobre o filme no livro “35 mm Dreams: Conversations with Five Directors about the Australian Film Revival”, de Sue Mathews, com exceção do final e da cantoria no banheiro, o restante foi praticamente idêntico ao que realmente aconteceu.

Um fato engraçado é que, após terminado e lançado o filme, por coincidência Weir precisou de um encanador para sua casa, o que acabou lhe rendendo uma inusitada situação onde o encanador contratado, que por acaso havia visto o filme, vira para o diretor e lhe pergunta se é essa a maneira como ele os enxerga, em tom, ao que parece, de brincadeira.

Querendo evitar todas as emoções que envolvem um lançamento no cinema, com seus altos e baixos, foi esse um dos motivos que levaram Weir a optar por desenvolver um projeto para tevê, e foi feito simplesmente por que àquela altura ele precisava de dinheiro. Simples assim. E que, nas próprias palavras dele, “acaba sendo uma ótima maneira de se fazer as coisas”. Portanto, foi feito com baixíssimo orçamento, mas com muita criatividade e um roteiro muito bem escrito, o que prova, mais uma vez, que não é necessário muito para se ter um grande filme.

 


 

 

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